Governo enviará projetos de corte de gastos e taxação de bets e fintechs para substituir a MP 1.303
- Editorial Resenha Diária

- 22 de out.
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Atualizado: 24 de out.
Após a derrubada da MP 1.303 na Câmara, o Planalto adotou a estratégia de fatiar a agenda fiscal: um projeto trará medidas de controle e redução de despesas para recompor o espaço no Orçamento de 2026; o outro reforçará a arrecadação com mudanças na tributação de apostas esportivas e de fintechs (incluindo aplicações e serviços financeiros), numa tentativa de estabilizar as contas e reduzir incertezas diante do calendário eleitoral e das pressões sobre a meta fiscal.

Ajuste fiscal em duas frentes
A decisão de enviar dois projetos de lei nasce do diagnóstico político de que a recomposição do arcabouço fiscal exigiria maior previsibilidade e trâmite menos sujeito a derrotas regimentais. Ao separar medidas de corte de gastos das de arrecadação, o governo tenta construir maiorias específicas para cada tema e reduzir contaminações entre debates. Interlocutores da área econômica avaliam que a divisão também facilita a negociação de prazos, exceções e gatilhos de contenção, preservando pilares do orçamento de 2026.
O que pode vir no pacote de despesas
No projeto de controle de gastos, a equipe econômica trabalha com instrumentos clássicos de contenção que costumam aparecer em ciclos de ajuste: revisão de despesas obrigatórias com expansão acelerada, limites mais rígidos para despesa discricionária, revisão de subsídios e de convênios com baixa efetividade, além do reforço a travamentos preventivos (contingenciamentos) quando a receita frustra a meta. A lógica é reduzir o ritmo de crescimento da máquina para que a política de receita não carregue sozinha o esforço de equilíbrio.
Receita extra: bets e fintechs no alvo
Do lado da arrecadação, o governo pretende reabrir a frente de apostas esportivas (bets) e fintechs, temas que constavam do escopo mais amplo da MP 1.303. A diretriz é reduzir assimetrias entre modelos de negócios financeiros, especialmente os que cresceram à margem de regras pensadas para bancos tradicionais, e fechar brechas de tributação em apostas online, segmento que se expandiu rapidamente e virou fonte relevante de receita potencial. O objetivo é elevar a base tributável sem penalizar o consumidor final além do necessário, calibrando alíquotas e incidências para minimizar distorções.
Por que a MP 1.303 caiu
A Medida Provisória 1.303, editada em junho de 2025, reorganizava a tributação de aplicações financeiras e ativos virtuais, previa taxação de apostas e incluía medidas de corte de despesas. Acabou derrubada na Câmara em meio a resistências setoriais, dúvidas sobre impacto distributivo e pressões regionais. Com o prazo político estreito e a agenda inflacionária ainda sensível, o governo optou por retirar a MP de pauta e buscar uma solução legislativa mais negociada, reduzindo o risco de nova derrota e preservando trechos com maior apoio.
Impacto esperado no Orçamento de 2026
As duas frentes — gasto e receita — dialogam com a necessidade de fechar o resultado primário e dar previsibilidade à execução orçamentária de 2026. Na prática, cortes e travas em despesas podem frear pressões sobre ministérios e custeio, enquanto a taxação de bets e ajustes sobre fintechs e aplicações tendem a combater erosões de base e reduzir o recurso a aumentos horizontais de impostos. A calibragem final definirá o efeito líquido no cumprimento da meta e na trajetória da dívida/PIB.
Reações no Congresso e no mercado
A divisão em dois textos tende a descompressar a negociação. Bancadas mais sensíveis a políticas sociais resistem a cortes lineares, mas podem aceitar revisões focalizadas e mecanismos de eficiência. Já setores econômicos afetados pela taxação defendem fase de transição e previsibilidade regulatória. Para o mercado, a sinalização de que haverá medidas estruturais no gasto, acompanhadas de receitas menos voláteis, é positiva; o risco é um desenho que sobrecarregue segmentos específicos ou introduza complexidade excessiva.
Pontos de atenção
Desenho das alíquotas e da base de incidência nas bets — equilíbrio entre arrecadação e manutenção da atividade regularizada.
Definição do que entra no escopo de fintechs (serviços de pagamento, crédito, investimentos) e como equalizar a competição com bancos.
Cláusulas de transição e vigência para evitar rupturas de curto prazo.
Gatilhos de gasto críveis, com métricas transparentes e relatórios periódicos para acompanhamento público.
Coordenação com LDO/LOA para impedir colisões de calendário e assegurar execução sem sobressaltos.
O que muda para o contribuinte
No curto prazo, não há alteração imediata até que os projetos sejam apresentados, debatidos e aprovados. A depender do texto final, apostas online e serviços financeiros hoje oferecidos por fintechs podem ter tributação revisada. Ao mesmo tempo, contenções de gasto podem reordenar prioridades em políticas públicas, com impacto na oferta de serviços e investimentos federais.
Próximos passos
O Ministério da Fazenda indicou que enviará os projetos ao Congresso em sequência, priorizando a construção de maioria e o alinhamento com o calendário orçamentário. O governo quer manter o discurso de responsabilidade fiscal e reduzir incertezas num ano de maior sensibilidade política. A tramitação na Câmara e no Senado dirá se a estratégia de fatiar a pauta dará o fôlego que faltou à MP 1.303.



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